
pintura de cora coralina feita pela artista Ary Salles, outros trabalhos estão a venda no site : http://www.lojadearte.com.br
Mais uma vez cora coralina despeja seus fantasmas em um poema auto biográfico, onde fala sobre tudo o que levou a formação de sua personalidade, da escritora à doceira, da pobreza à riqueza intelectual, do bucolismo e da identificação com a natureza de sua região à sociedade sádica e preconceituosa de sua época, podemos observar que a poetisa jamais se considerou uma grande escritora e sim uma cozinheira que por ela é chamada de a mais nobre de todas as artes.
Cora Coralina, quem é você?
Sou mulher como outra qualquer.
Venho do século passado
E trago comigo todas as idades.
Nasci numa rebaixada de serra
entre serras e morros.
“Longe de todos os lugares”.
Numa cidade de onde levaram
o ouro e deixaram as pedras.
Junto a estas decorreram
a minha infância e adolescência.
Aos meus anseios respondiam
as escarpas agrestes.
E eu fechada dentro
da imensa serrania
que se azulava na distancia
longínqua.
Numa ânsia de vida eu abria
o vôo nas asas impossíveis
do sonho.
Venho do século passado.
Pertenço a uma geração
ponte, entre a libertação
dos escravos e o trabalhador livre.
Entre a monarquia
caída e a republica
que se instalava.
Todo o ranço do passado era
presente.
A brutalidade, a incompreensão, a ignorância, o carrancismo.
Os castigos corporais.
Nas casas. Nas escolas.
Nos quartéis e nas roças.
A criança não tinha vez,
os adultos eram sádicos
aplicavam castigos humilhantes.
Tive uma velha mestra que já
havia ensinado uma geração
antes da minha.
Os métodos de ensino eram
antiquados e aprendi as letras
em livros superados de que
ninguém mais fala.
Nunca os algarismos me
entraram no entendimento.
De certo pela pobreza que marcaria
para sempre a minha vida.
Precisei pouco dos números.
Sendo eu mais doméstica do
que intelectual,
Não escrevo jamais de forma
consciente e raciocinada, e sim
impelida por um impulso incontrolável.
Sendo assim, tenho a
consciência de ser autêntica.
Nasci para escrever, mas, o meio,
o tempo, as criaturas e fatores
outros, contramarcaram minha vida.
Sou mais doceira e cozinheira
do que escritora, sendo a culinária
A mais nobre de todas as Artes:
objetiva, concreta, jamais abstrata
a que está ligada à vida e
à saúde humana.
Nunca recebi estímulos familiares para ser literata.
Sempre houve na família, senão uma
hostilidade, pelo menos uma reserva determinada
a essa minha tendência inata.
Talvez, por tudo isso e muito mais,
sinta dentro de mim, no fundo dos meus
reservatórios secretos, um vago desejo de analfabetismo.
Sobrevivi, me recompondo aos
bocados, à dura compreensão dos
rígidos preconceitos do passado.
Preconceitos de classe.
Preconceitos de cor e de família.
Preconceitos econômicos.
Férreos preconceitos sociais.
A escola da vida me suplementou
as deficiências da escola primária
que outras o Destino não me deu.
Foi assim que cheguei a este livro
sem referencias a mencionar.
Nem menção honrosa.
Nenhuma Láurea.
Apenas a autenticidade da minha
poesia arrancada aos pedaços
do fundo da minha sensibilidade,
e este anseio:
procuro superar todos os dias
Minha própria personalidade
renovada,
despedaçando dentro de mim
tudo o que é velho e morto.
Luta, a palavra vibrante
que levanta os fracos
e determina os fortes.
Quem sentirá a Vida
destas páginas..
Gerações que hão de vir
de gerações que vão nascer.
Um comentário:
é realmente muito lindas as pinturas deste site há várias retratações dos becos de goias e da casa velha da ponte.
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